sábado, 25 de março de 2017

Um dia toparei comigo - o fio de Ariadne de Paula Fábrio


Achará, à primeira vista, a leitora, o leitor, que lerá um livro sobre a viagem de duas mulheres, companheiras, a Madri.  Que esta viagem poderá ser também outras que o livro conta, ao Rio de Janeiro, Teresópolis, ou à França, Paris. Poderá achar, ainda, que será encontrar Buenos Aires, Roma e tantos outros lugares aos quais a vida de Isabel, a narradora, e Virgínia nos levam. Será somente à primeira vista.

Em Um dia toparei comigo, de Paula Fábrio, a viagem que realmente faremos junto de sua protagonista será ao labirinto, forma e tema se encontrando, pois que o labirinto é tanto a falta de linearidade em que a narrativa se desenvolve quanto o lugar sem mapa, sem paradeiro, sem avisos prévios em que a vida nos lança, logo que nascemos.

Nas palavras de Isabel, Virgínia é a pessoa com quem compartilha a fobia de viver. A narradora, tendo passado recentemente pela morte do pai, acometido pelo câncer, viaja com a companheira – que vive apenas um mês por ano, o mês de férias – e encontra, na Espanha, outros amigos. O que parecia ser uma pausa do assunto mal acabado, a morte, deixado no país de origem, retorna, pois o tio de Luís, seu Ramires, também está morrendo. Desencadeada pela beleza e o alumbramento das novas paisagens, a memória aciona as lembranças dos fatos. Passado e presente se cruzam, todo o tempo. Perceber esses personagens, justamente no vai e vem da lembrança de Isabel, é ir compondo o livro juntamente com a autora. Ela vai dando à leitora, ao leitor, a chance desse exercício de imaginação: aos poucos, tudo fará sentido, porque nada tem.

É da vida sem sentido, é de dar sentido à vida, é de tentar encontrar as saídas possíveis para nascer e morrer, entre um ato e outro, que o livro de Paula Fábrio nos fala. Fala de luta, a diária – que não parece um grande feito, mas é – e resignação. Os personagens de Um dia toparei comigo são tão frágeis quanto eu e você, guardam fracassos mesmo já tendo estado “no maior do auge”. O tom é de uma melancolia profunda e bela, que a obra de arte alcança. Sem piedade alguma, a autora revela nosso sentimento tão constante de estarmos perdidos, estrangeiros em qualquer terra e, principalmente, estrangeiros dentro de nós mesmos. O Minotauro deste labirinto é o espelho.

No fim da leitura, eu que, por demais, já gostava do título, passei a gostar mais ainda. “Um dia toparei comigo” é uma esperança. E no livro de Paula Fábrio, com seu fio de Ariadne nos conduzindo, é uma realização.

“Não havia o que fazer nas próximas horas, dias, e também e também não importavam os ponteiros do relógio. Eles marcam a duração da alegria e só. Até mesmo o túnel do tempo não seria vantagem, caso não saibamos tim-tim por tim-tim o que fazer da vida. Presumo, toda viagem é um pouco à deriva e, enquanto não nos conformamos em fruí-la sem nos debater, não poderemos nem ao menos contar uma boa história aos próximos da fila.
Quando não há o que fazer, caminha-se.”

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Romance/ Um dia toparei comigo/Paula Fábrio/Editora Foz, 2015


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