quinta-feira, 25 de abril de 2013

Prossigo a leitura irresistível.
Diálogo entre Iliá Ilitch Oblómov e Stolz, o amigo alemão:



“ – A sociedade, o mundo! Você, Andrei, sem dúvida me levou de propósito para essa sociedade, esse mundo, para que eu perdesse toda vontade de estar lá. A vida: a boa vida! O que vou encontrar lá? Interesses intelectuais, afetivos? Veja você mesmo, qual é o centro em torno do qual gira tudo isso? Não existe centro nenhum, não existe nada de profundo, nada que toque no âmago da vida. São todos pessoas mortas, adormecidas, piores do que eu, esses membros da sociedade e do mundo! O que fazem eles da vida? Não ficam deitados, mas correm para lá e para cá todos os dias, como moscas, e qual o sentido disso? A gente entra num salão e se admira de ver como os convidados são distribuídos com simetria, como se acomodam de modo gentil e sóbrio... diante das cartas de um baralho. Nem se discute, é uma da missões sagradas da vida! Ótimo exemplo para uma mente em busca de movimento! Por acaso não são uns cadáveres? Por acaso não passam a vida toda dormindo sentados? Por que sou pior do que eles, se fico deitado em minha casa e não corrompo a cabeça com trincas e valetes?
 –Tudo isso é antigo, já falaram mil vezes desse assunto – comentou Stolz.  – Será que você não tem nada de novo para dizer?
– E nossa melhor juventude, o que ela faz, afinal? Por acaso não está dormindo enquanto caminha ou anda de carruagem pela avenida Niévski, ou enquanto dança? Como é rotineiro e vazio esse modo de preencher os dias! E veja com que orgulho e misteriosa dignidade, com que olhar repugnante contemplam quem não se veste como eles, quem não tem o mesmo título e a mesma posição social que eles. E os infelizes ainda imaginam que estão acima da multidão comum: “Nós ocupamos, no serviço público, postos melhores do que os de todos os outros; sentamos na primeira fileira de poltronas no baile do príncipe N., num lugar onde só nós temos permissão para entrar”... E quando se reúnem sozinhos, bebem demais, brigam como feras! Será que isso é coisa de gente que vive, que não está dormindo? Mas não é só a juventude: veja os mais velhos. Reúnem-se, servem jantares uns para os outros, sem cordialidade... sem bondade, sem afeição recíproca! Reúnem-se para um jantar, para uma festa, como se fosse no local de trabalho, sem alegria, friamente, para se vangloriar do cozinheiro, do salão, e depois de trocarem gracejos de braços dados tentam passar a perna uns nos outros.  Anteontem, durante o jantar, eu nem sabia para onde olhar, minha vontade era me enfiar embaixo da mesa quando começaram a trucidar a reputação das pessoas ausentes: “Fulano é um imbecil, sicrano é um patife, aquele é um ladrão, o outro é ridículo”... uma verdadeira chacina! E enquanto falavam assim, miravam nos olhos uns dos outros como se dissessem: “É só sair por aquela porta que você será o próximo...”. Por que eles se encontram, se são assim? Por que apertam as mãos uns dos outros com tanta força? Não se vê nenhum riso sincero, nenhum lampejo de simpatia! Esforçam-se para atrair alguém de alto escalão para sua casa. E depois se vangloriam: “Na minha casa esteve fulano, e eu estive na casa de sicrano...”. Que vida é essa, afinal? Não quero essa vida. O que tenho a aprender com isso, o que vou extrair daí?
– Sabe de uma coisa, Iliá? – disse Stolz. – Você pensa como os antigos: tudo isso está escrito nos livros velhos. Mas, afinal, isso também é bom: pelo menos está refletindo, não está dormindo. Bem, e o que mais? Prossiga.”                       

(Publicado pela primeira vez, na Rússia, em 1859)

Trecho de Oblómov, Ivan Gontcharóv. Tradução direta do russo por Rubens Figueiredo. Cosac e Naify.



quarta-feira, 24 de abril de 2013

    Estou lendo Oblómov, de Ivan Gontcharóv, uma edição maravilhosa da Cosac Nayf, com tradução primorosa de Rubens Figueiredo.
    Ainda estou na página 265, admirada por descobrir como é possível a um autor ultrapassar páginas e páginas, falando da inação, com um protagonista que nada faz e que nos encanta por toda a sua verdade.
    Imperdível. Volto para cá, quando chegar à página 733. Abraço e luz.